sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Dadá em Berlim ou a Antiarte a serviço da Revolução:

Para auxiliar os profanadores dos signos do capital, nada como um passeio agradável pelo dinamitado reino Dadá durante o fim da Primeira guerra mundial. Mas cuidado com a sinalização: o endereço certo não é Zurique mas Berlim. A tempestade niilista pode ter começado a dar seus primeiros raios de poesia fonética e gotas irracionais na cidade suíça, mas o contexto histórico que de fato permitiu o desenvolvimento deste grande protesto contra a civilização ocidental, foi o alemão. A rapaziada que hoje produz seus cartazes, rabisca seus desenhos e compõe seus poemas feitos de ódio e humor selvagem, acaba inevitavelmente bebendo do Dadá alemão.Isto tende a acontecer porque esta referência histórica legou técnicas, situações e soluções gráficas que não estão ultrapassadas; pois afinal de contas, sua modernidade nascida sobre o combate anticapitalista se comunica brutalmente ainda hoje.
  Na História do movimento Dadá atribui-se muita importância a Tzara, chegando ao absurdo de muitos historiadores interpretarem os desdobramentos Dadá a partir das ações do poeta romeno. Acontece que diferentemente de Zurique, Nova York(e a partir de 1921, Paris), Berlim reuniu as condições políticas para que o Dadá aprimorasse seu instinto destrutivo em conexão com a consciência política revolucionária. Entre 1918 e 1923 os dadás alemães participam dos conflitos de rua e de todos os esforços contra a classe dominante, que havia sufocado com sangue jovem o velho mundo europeu. Sob a atmosfera da Revolução abortada de 1918, o movimento Dadá incrementa com novas técnicas o insulto direcionado á burguesia alemã. Richard Huelsenbeck, Raoul Hausmann, Georg Grosz e outros compreenderam que a destruição do conceito de arte empregado pela burguesia, era apenas a etapa de uma luta maior: derrotar politicamente a própria burguesia.
  Seria forçar a barra dizer que o Dadá na Alemanha tornou-se tão simplesmente a ilustração de uma doutrina política, seja ela o comunismo ou o anarquismo. Mesmo com a adesão dos membros do movimento Dadá a estas duas correntes ideológicas, os dadás sempre agiram dentro da sua louca anti-doutrina, alimentada pelo direito de contradizer-se, de afirmar e logo em seguida negar. A irracionalidade Dadá atuava assim como um suporte de desconstrução do gosto e da lógica, uma arma cuja engenharia maluca disparava traquinagens que desafiavam a moral estabelecida e ao mesmo tempo preparavam terreno para uma Revolução socialista. Mesmo que a essência Dadá fosse recusar qualquer discurso ou ideia preconcebida, a luta de classes acabou falando mais alto do que a natureza " anti " tudo do movimento. Foi preciso politizar o insulto pois este responde a uma realidade histórica concreta.
  Esculhambando os futuristas, os cubistas e os expressionistas, os dadás proclamavam que as soluções estéticas de tais movimentos estavam ultrapassadas na medida em que a arte sede lugar a antiarte e esta última se faz instrumento moderno e iconoclasta, para arrebentar na base da porrada simbólica a cultura dominante. Com a fundação do CLUB DADÁ e a criação de inúmeros periódicos, as imagens e as palavras articuladas na tentativa de desconcertar a sociedade vigente, geraram experiências que até hoje nos servem de inspiração para injúrias anticapitalistas. Os diferentes níveis imagéticos da fotomontagem, sua capacidade em aliar dialeticamente materiais e mensagens de naturezas opostas(no primeiro caso a superfície lisa ou áspera, o contraste entre as diferentes formas e  ângulos distintos na captação de imagens pela fotografia) conferiram ao Dadá um experimentalismo que se espalha pela rua: não é coisa de salão, pois as fotomontagens reproduzidas em revistas e cartazes invadem como um amontoado de vírus clandestinos a saúde do burguês. Exemplo bacana desta atitude está tipificada no experimentalismo gráfico de Cada um é sua própria bola de futebol. Mas se existe um documento que ajuda a entender a pólvora teórica e prática do Dadá alemão, este é evidentemente O Almanaque Dadá, encabeçado por Huelsenbeck. Poderíamos acrescentar ainda as experiências da poesia abstrata e a optofonética, que empenhadas na apresentação das palavras independentes de qualquer objeto, fizeram troça das noções tradicionais da literatura.
  Então tá, seria relevante reproduzirmos estas experiências do Dadá alemão? Quem faz cópia é máquina mas quem acredita em " genialidade " optou pela burguesia. Não se trata de copiar nada, mas de refletir como o desejo destrutivo que permeia parte da arte militante de hoje, tem parte dos seus antecedentes no Dadá alemão. Definir atualmente os limites entre arte e antiarte é problemático e até desinteressante, mas situar a expressão enquanto gesto, ação de enfrentamento ás gaiolas do mundo civilizado, ainda é uma necessidade histórica. Portanto, o Dadá alemão está em pauta quando o assunto é a(nti)rte revolucionária.


                                            Os Independentes 

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