sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Prólogo da peça teatral " Mistério-Bufo ", de Maiakóvski:

UM IMPURO:
Dentro de um minuto
Vocês vão ver...
Mistério-bufo
Duas palavras devo dizer:
é algo novo.
Para dar um pulo mais alto que a cabeça
é necessária a ajuda de alguém.
Diante de uma nova peça
um prólogo sempre vai bem.
Primeiro,
por que o teatro está todo revirado?
Isto vai deixar
os bons cidadãos muito indignados.
Ora, para que se vai ao teatro?
Para ter algum prazer, não é fato?
Mas esse prazer é suficiente
se ele está no palco somente?
O palco é apenas um terço do todo.
Quer dizer,]num espetáculo interessante,
se tudo se faz bem,
três vezes prazer você tem,
mas agora,
se não é interessante o que se vê em cena
então nem um terço
vale a pena.
Para os outros teatros
representar não é importante:
para eles o palco é
o buraco da fechadura.
Sentado, calado, passivo,
de frente ou de banda,
você espia a vidinha alheia.
Espia e vê
cochichar no sofá
tias Manchas e tios Vânias.
A nós não interessam
nem tios nem tias,
tia e tio você tem casa.
Nós também vamos mostrar a vida real,
mas transformada
num extraordinário espetáculo teatral.
No primeiro ato é o seguinte o essencial:
a terra está pingando.
Depois há um estrondo.
Todos fogem do dilúvio revolucionário.
Sete pares de impuros
e de puros sete pares.
Isto é,
quatorze proletários-indigentes
e quatorze senhores burgueses,
e, no meio deles,
um menchevique com um par de bochechinhas chorosas.
O polo inunda.
Desmorona o último refúgio.
E todos começam a construir
não uma arca,
mas um arquerefúgio.
No segundo ato
O público todo viaja na arca:
lá vai a monarquia absoluta,
e a democracia república,
e, por fim,
sob os altos brandos mencheviques
os puros são postos mas afora.
No terceiro ato vai se ver
que o trabalhador
não tem nada a temer
nem mesmo o diabo no inferno a tremer.
No quarto
ria até rachar!
o paraíso vamos desvendar.
O quinto ato é a ruína completa
e boquiaberta
arruína, devora.
Apesar de trabalharmos com a pança vazia,
a ruína foi enfim por nós vencida.
O sexto ato
é a comuna,
a sala toda
aos berros uma canção entoa tão bem!
Abram bem os olhos, hein!

Tudo pronto?
O inferno?
O paraíso?

VOZ(atrás do palco)
P-r-o-n-t-o!

IMPURO:
Manda ver!




                                          Vladímir Maiakóvski, 1920.

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